Hoje gostaria de  trazer-lhes uma reflexão, sem grandes pretensões, talvez enquanto uma forma de simples desabafo.
Como é de conhecimento de quem acompanha nosso coletivo Teodoras do Cordel, estamos em turnê pelas bibliotecas da cidade de São Paulo, através do projeto “Vozes Periféricas – Mulheres em Ação na Arte e no Cordel”, através da secretaria da Cultura da Cidade de São Paulo, pela qual fomos contratadas.
Tem sido uma experiência maravilhosa e intensamente especial. Até o momento percorremos 7 bibliotecas de São Paulo e cada vivência tem sido única e mágica, de modo a nos dar cada vez mais garra para seguir em frente com nossa proposta e arte.
No entanto, em uma das bibliotecas agendadas para uma de nossas apresentações, a experiência foi um pouco diferente das demais.
Quando chegamos ao local, nos ofereceram um cantinho no andar de cima e nos informaram que o anfiteatro do espaço seria usado para um outro evento que aconteceria no mesmo horário do nosso. Para esse outro evento teria público, que foi previamente convidado por eles e para o nosso não haveria.
Quando deu nosso horário de início de apresentação, começamos a tocar nosso repertório e as crianças que chegavam para o outro evento rapidamente se viram envolvidas com nossa música e foram nos assistir. Então subiu uma senhora onde nos apresentávamos, nos interrompeu o show e disse que as crianças precisavam sair e descer para o outro evento que ocorreria no anfiteatro.
Bem, depois de muito conversarmos entre nós sobre mais uma aparente e gritante desvalorização da literatura de cordel, e desta vez, pasmem!, dentro de uma biblioteca, eu fiquei pensando, pensando e repensando.
Eu acredito que o triste episódio que aconteceu conosco nessa biblioteca em si, foi além de preconceito/ignorância para com o cordel, o enxergando absurdamente enquanto uma literatura menor, mesmo hoje ele sendo reconhecido como patrimônio imaterial pelo IPHAN. Foi algo além disso.
Nós estamos em um projeto lindo intitulado “Vozes Periféricas” e acho que até então só havíamos passado por bibliotecas com essa “pegada” mais “periférica” mesmo,  sabe? Seja pela localização ou pela “filosofia” da qual compartilhamos. E quando caímos em uma biblioteca num local não periférico, pq sim, esta biblioteca em questão se localizava em um local  nada  periférico, muito pelo contrário,  um local que inclusive pode ser considerado elitista e privilegiado, parece que há uma dificuldade por parte de sua equipe em acolher um projeto que se autointitula periférico.
Não podemos usar o anfiteatro pq somos periféricas? Não tivemos acesso ao público pq somos periféricas? Nos sugeriram ir à praça chamar público pq somos periféricas? (ainda teve este adendo que informo aqui).
Enfim… Fiquei pensando muito sobre isso durante essa madrugada que se passou.
Então o preconceito está mais além do que imaginávamos. Mas sigamos fortes com nossa literatura de cordel tão rica e maravilhosa e com nossa cultura periférica tão forte, incrível e resistente, detentora da mudança. E assim será!

E sigamos com poesia! Porque poesia é resistência e resistência sempre seremos!

 

No profundo oceano
Onde outrora fui jogada
Entre esta, outra braçada
Neste nado tão insano
Penso: aquilo fora um plano
Pra minh’alma sucumbir
De meu corpo então fugir
Mas a besta que me habita
Dia e noite cá transita
Faz-me rija a resistir.

 

Um abraço,
Graziela Barduco.

Graziela Barduco