Hoje me veio novamente à cabeça um episódio que aconteceu comigo há alguns anos. Acredito que muito por conta da triste morte precoce, na semana passada, da influencer e assistente de palco que foi fazer uma lipo nos joelhos e, em decorrência desta cirurgia, teve uma embolia pulmonar e veio a falecer.
O fato em questão foi noticiado nos principais jornais e, assim que eu li no jornal que assino, quase que automaticamente tive a curiosidade de buscar seu perfil nas redes sociais, primeiro porque eu não a conhecia, segundo porque eu não sabia que era possível se fazer uma lipo nos joelhos e terceiro porque não passava pela minha cabeça que pudesse existir uma queixa de que nossos joelhos pudessem também serem “acusados” de gordos. Depois ouvi as explicações sobre a condição vascular crônica chamada lipedema, da qual sofria a influencer e fui entender melhor sobre isso.
Mas, assim que vi suas fotos em seu Instagram, eu fiquei automaticamente em choque, pois me deparei com uma moça extremamente linda, magra, maravilhosa, com um corpo perfeito (incluindo aqui suas pernas e joelhos na minha humilde opinião), uma carreira promissora e de sucesso, e sobretudo que aparentava ser imensamente amada pela família, namorado, amigos e por seus fãs.
Eu fiquei absolutamente entristecida e me perguntando o porquê de coisas deste tipo acontecerem com tanta frequência, sobretudo com mulheres.
Por que o corpo da mulher é sempre alvo de críticas ferrenhas (ainda mais se ela está exposta na mídia) e nunca está bom do jeito que está?
Eu ouvi uma entrevista de uma psicanalista na qual ela dizia que o corpo perfeito para uma mulher é o corpo do homem, porque o da mulher nunca está bom, ao passo que o do homem, não costuma ser bombardeado por essa imensidão de críticas como o da mulher o é. Achei simplesmente genial essa fala dela, pois acredito sim que a crítica é sempre mais pesada sobre a mulher, herança, é claro, do nosso já conhecido machismo estrutural.
Eu li outro dia sobre uma pesquisa feita no ano de 2020, pela Sociedade Internacional da Cirurgia Plástica, que, dentre aqueles que se submetem à cirurgias plásticas, 86,3% são mulheres e 13,7% homens. Acredito que tais índices dizem muito.
Mas voltando ao tal episódio que mencionei que me veio à minha cabeça, do qual comecei este artigo falando sobre, segue o incidente, que me acontecera há alguns anos.
Eu tinha acabado de deixar meu trabalho como editora de vídeo (trabalho este decorrente de minha primeira formação acadêmica, pois sou graduada em Cinema), para trabalhar como modelo e passei a integrar o casting de modelos da Elite Models aqui no Brasil.
Na ocasião, só tinha a pós-graduação em Administração, além da graduação mencionada, bem como tinha voltado a estudar teatro.
Naquele tempo eu estava gostando daquilo, me fazia feliz, eu ganhava bem (bem mais do que na edição de vídeo) e também aquela novidade toda aumentava a minha autoestima, que, diga-se de passagem, nunca fora muito boa.
O fato é que, dentre várias das campanhas que costumava pegar, fui aprovada para uma campanha de uma empresa muito bem conceituada de cama, mesa e banho, com uma temática bem interessante e um cachê bacana também.
Bem, eu cheguei ao estúdio para fotografar muito alegre, como de costume, fui bem recebida, estava trocando ideia com as outras modelos, porém alguns minutos depois, o produtor/diretor de arte veio até mim e disse que precisaria me dispensar do trabalho.
Eu perguntei a ele o porquê da dispensa e ele me disse na lata: “você é linda, mas a sua coxa é muito grossa e isso não é nada chique, então fica fora do padrão para a campanha”.
DETALHE: eles tinham me aprovado para o trabalho com muita antecedência, tinham todas as minhas medidas, várias fotos, todo o meu material, etc e tal.
Na época me lembro que saí destroçada de lá.
Chorei muito, liguei para a agência que também pareceu se indignar (ou pelo menos fingiu muito bem, porque atitude mesmo para solucionar o embate não tomou), liguei para meu marido me buscar, fiquei mal pacas e tudo o mais.
Bem, não por acaso, essa história voltou-me à cabeça ao ver o acontecido com a influencer que teve este final tão triste, bem como não foi à toa que recentemente senti a necessidade gigante de publicar um cordel intitulado “Minhas Curvas de Estimação”, que é um dos meus mais novos lançamentos, e que fala exatamente sobre toda esta temática abordada aqui neste artigo.
Ele nasceu enquanto uma espécie de manifesto da mulher que não admite que qualquer padrão de beleza lhe seja imposto e que entende que seu corpo é lindo à sua maneira. É um cordel de autoaceitação e de empoderamento feminino, bem como de cura interior, da menina que já fora machucada com palavras que lhe perfuraram a alma por não estar com o corpo dentro de um padrão de beleza a ela tantas vezes exigido.
Seria um sonho se pudéssemos ser e simplesmente ser, cada qual à sua maneira, bem como contribuir com o mundo das mais variadas formas possíveis, para além da casca que nos é imposta.
Enquanto isso, sigo aqui na minha batalha para que tais amarras sejam cada vez mais e mais eliminadas, de modo que se faça presente “o ser de verdade e a verdade no estar.”:

Outrora tive dúvidas tão selvagens
Sentia o corpo jogado às margens
E a alma um tanto despercebida
Dor mais cruel de minha vida

Cavei um buraco um tanto fundo
Inverti e devastei todo meu mundo
Rabisquei meu diário favorito
Soterrei o que tinha de mais bonito

Eu tinha um sorriso curto
Eu falava tão mais livremente
E a amargura me provocava surto
E o corpo comunicava descrente

Então me vejo tão tímida agora
Eu não era assim, eu fui embora
Ao fugir da arrogância de certo olhar
Meu livre discurso estava a minguar

E me deparo com uma leveza que cura
Com a maravilha de uma alma pura
Mergulho profundo no céu encantado
Saltei do buraco que havia cavado

Meu discurso hoje é movimento
Meu saber está neste mais puro olhar
Trabalho a escuta do pensamento
Compartilho a essência do que é amar

Curtas palavras, longos sorrisos
É desta forma que quero propagar
A delicadeza sem tantos avisos
O ser de verdade e a verdade no estar.

Com carinho,
Graziela Barduco.

Graziela Barduco